17 de março de 2014
por bicicletanarua
“Esta poesia é dedicada a todos os ciclistas mortos por atropelamento nesse país e, em especial, ao nosso companheiro ciclístico Egon Koerner Júnior, que falecei atropelado por um motorista bêbado quando participava de uma prova de superação – Audax na cidade de Curitiba.”
BICICLETA FANTASMA
Cabisbaixa às margens da estrada, subjugada, punida, ignorada, batida pelo tempo.
Sou bicicleta fantasma, minha morte faz te lembrar
Que hoje sou bicicleta sem alma; muitas outras eu tento salvar.
Dividida, atônita, aturdida, pressa ao teu passado; sofro só de vê-los passar sem um corpo a me pedalar.
Sou bicicleta branca, fantasma, sabe lá o nome que querem me dar,
Sou calada, amordaçada, indefesa e não posso falar.
Sou bicicleta sem alma, minha morte faz te lembrar
Ninguém sabe agora és morta.
Nem disso eu posso falar.
Amordaçam minhas rodas, não posso gritar.
Entre amarras e presilhas, meu corpo minhas rodas estão livres mas não posso tu levar.
Sou bicicleta morta, o significado de estar morta só eu posso lhes mostrar.
Sou uma velha, desprezada, reciclada, remontada sabe lá, o nome que querem me dar,
Mas sou bicicleta morta e da morte te fazer lembrar.
Sou menina, sou menino, não importa! Sou simplesmente bicicleta morta.
Fui roubada, ultrajada para outro me usar, mas sou bicicleta morta e pro meu lugar devo voltar.
Vejo amigos, vejo estranhos, vejo a vida me rondar.
Vejo as lágrimas da amada que se curva a chorar.
Vejo luas, tempestades, vejo o inverno passar.
Vejo flores de saudades, lembranças a me acalentar.
Represento vida e morte daqueles que vejo passar.
Sou bicicleta morta, e morta estou,
Sou bicicleta branca, e branca estou,
Sou fantasma sem alma, sabe lá o nome que ainda terei
Fantasma sem alma; morta está… e branca me tornei.
Tu que me fizeste fantasma, branca sem alma, de ti sempre lembrarei.
Nicolau Marques Júnior
[Florianópolis, 2014]